segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

A qualidade da propaganda

Por um dever de ofício, resolvi assistir, com um olhar de crítica, à televisão durante algumas noites para ver de perto a qualidade do que se produz e se veicula atualmente nesse meio de comunicação. Fiz isso porque constantemente sou cobrado por estudantes, professores e amigos dos mais variados segmentos de mercado, que chegam ao absurdo de acreditar que tudo de bom e de ruim que é veiculado na mídia é serviço de agência de propaganda. Não é não, mas eles não sabem disso.
Confesso que, em termos de qualidade e conteúdo, vi pouca coisa boa, bem pouco para justificar os custos de produção e veiculação pagos pelos anunciantes. Não vou citar as emissoras a que assisti e muito menos as peças de boa e de má qualidade, porque fiz questão de não procurar saber quem as fez, para não cometer injustiças e também porque, acredito sinceramente, que fazer trabalho sério e profissional não é mais do que nossa obrigação, como também é nossa obrigação saber escolher o meio mais indicado para mostrar o que fazemos. Em outras palavras, se você fizer um filme de alta qualidade, não vai ter coragem de veicular numa televisão de baixa qualidade e vice versa.
O que vi, em três noites, foi muita propaganda ruim, medíocre mesmo, muitos filmes e VTs com a cara daquelas coisas que são feitas por amadores, verdadeiros primatas em matéria de comunicação, muitas vezes o próprio anunciante, que por ser o dono do dinheiro se reserva o direito de teimar em fazer certas excrescências que ele mesmo chama de “bolação”.
Até parece que voltamos ao tempo em que só existiam os corretores de anúncios.
Vi muitos filmes e vts. de produtos para limpeza de pele, alisamento de cabelo, remédios para dor de barriga, vitaminas, fortificantes, prisão de ventre, fígado, cólicas - as mais diversas, emagrecimento, tem até um em que uma mulher diz que perdeu vários quilos na primeira semana de uso.
Ora, considerando que o ano tem 52 semanas, se aquela senhora continuar tomando o famigerado produto, emagrecendo digamos, dois quilos por semana, no fim do primeiro ano terá perdido 104 quilos e com isso, vai, de fato, não apenas emagrecer, mas vai, sim, é desaparecer. O que é um tremendo absurdo é que se trata de produtos que deveriam, no mínimo, ser obrigados a declarar o nome do fabricante, endereço, nome do farmacêutico responsável e outros dados de segurança. E o que é ainda mais grave é que, nesses casos, parece não existir a ação de órgãos como a Anvisa que vivem culpando a propaganda pelos males do mundo.
A péssima qualidade do que se vê na televisão é preocupante, porque, infelizmente, é em número muito maior do que as coisas de boa qualidade. Os resultados dessas criações antidiluvianas podem ser sempre antecipados. Será nenhum, e aí a culpa pelos maus resultados acaba recaindo sobre a propaganda.

Essa gente está destruindo a nossa arte, como dizia o poeta de cordel, indignado com a má qualidade que alguns pretensos cantadores estão introduzindo na velha e boa literatura de cordel.

"Basta um cabra não ter disposição,
pra viver do serviço de alugado.
Pega a viola e bota ela do lado,
compra logo o romance do Pavão,
a peleja do Diabo e Riachão,
sai pro mundo a gabar-se em toda parte
e a berrar por dez réis no "mei" da feira.
Parasitas assim, dessa maneira,
é que estão estragando a minha arte..."


Preservemos nossa arte, a propaganda, amigos.
Ainda há tempo de fazer alguma coisa.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Mesas de Compra, Bureaux de Mídia, Bolseros...

Em 24 de novembro de 2002, o nosso Propaganda & Marketing publicou um artigo no qual eu falava do sofrimento de um publicitário argentino que não conseguia mais negociar com seus clientes, porque os “bolseros,” uma espécie piorada de "bureaux" de mídia daquele país, destruíram a relação de sua agência com um de seus mais importantes clientes. O arrocho pela rebaixa de preços na compra de espaço foi tão grande, que acabou se transformando num negócio direto entre anunciante e veículo. A partir daí, esse mesmo cliente passou a empregar a mesma técnica, para forçar a agência a rebaixar seus preços de criação, produção e até a repassar para sua caixa registradora uma grande parte dos honorários de veiculação pagos pelos veículos.
A agência, para não perder o cliente, aceitou as regras desse jogo maldito, e foi obrigada a reduzir seus ganhos, trocar seus profissionais por outros, de preço e de qualidade inferiores.
Falando agora com esse mesmo amigo, até para ver qual foi resultado, soube que ele fechou as portas de sua empresa e hoje trabalha numa outra, que sempre foi maior do que a sua. Essa atual agência resistiu até meados deste ano de 2009, mas com certeza não vai aguentar a mesma pressão que ele sofreu em 2002. Não deverá ir muito longe, pois já está trilhando o mesmo caminho de redução de custos, contratação de mão obra inferior, redução de salários, repasse de honorários de veiculação e, lamentavelmente, deverá ser mais uma boa agência a encerrar suas atividades.
Isso é uma prova irrefutável de que a pressão pela rebaixa de preços enfraquece sempre a parte mais fraca, nesse caso, a agência, que vê seus valores não só financeiros, mas principalmente sua dignidade e seus históricos valores morais e profissionais serem dilapidados por um implacável comprador, que só sabe comprar preços e descontos, e não percebe o mal que está fazendo à sua própria empresa, como anunciante, que a partir daí, não mais terá moral para exigir a qualidade que vinha recebendo, enquanto reconhecia e pagava o preço justo e honesto pelo trabalho do outro.
No Brasil, o setor de mídia de nossas agências está muito bem estruturado, e conta com profissionais da alta qualidade em todos os escalões e insisto que aqui não precisamos de bolseros, bureaux e mesas de compra.
Vejo com séria precupação que as mesas de compras de que tanto se fala atualmente, se pegarem, vão se prestar apenas para enfraquecer um dos lados, a agência e, convenhamos amigos, parceiro fraco não é bom parceiro.

(Publicado originalmente em: Propaganda& Marketing, out 2009).

Os profissionais do futuro

No dia 4 de outubro nosso Propaganda & Marketing publicou um brilhante artigo de Júlio Ribeiro sobre as agências de propaganda o futuro, e então fiquei com vontade de escrever sobre o que espero dos profissionais que vão “tocar” as nossas agências no futuro.

Vivo conversando com os estudantes de propaganda em universidades por esses brasís afora, sobre os mais variados temas, e estou entregando cópias daquele artigo do Júlio, para que a “estudantada” entenda que as agências de propaganda precisam continuar existindo, ou não teremos comunicação de qualidade amanhã. Como um velho contador de histórias, procuro lhes mostrar como a nossa atividade foi construída com base na ética, no compromisso de respeito ao ofício e na prática do profissionalismo em tempo integral, por grandes nomes como Renato Castelo Branco, Caio Domingues, Gerard Wilda, Otto Scherb, Rodolfo Lima Martensen, Armando D’Almeida, Italo Ebole, Emil Farah, Antonio Nogueira, Italo Bianchi e tantos outros, para citar apenas alguns que já não estão entre nós. Falo também sobre os grandes profissionais vivos e só não cito os seus nomes aqui neste texto, porque conhecendo sua grandeza e humildade, sei que certamente dispensariam a citação.
Nossos jovens querem saber muitas coisas sobre os 4 congressos de propaganda já realizados até aqui e tudo o que esses grandes eventos nos legaram, e aí tenho uma grande oportunidade para falar de CONAR, IVC, Códigos, compromissos, acordos, leis e dispositivos legais que muito contribuíram para transformar a propaganda brasileira, numa das melhores do mundo.
Procuro mostrar-lhes que na propaganda do futuro não haverá lugar para amadores, porque neste terceiro milênio, é preciso optar por um profissionalismo que anda na velocidade de um avião a jato, enquanto os que escolherem o amadorismo, com todos os seus malefícios, vão andar lentamente (e ainda bem), a passo de tartaruga e, como geralmente os mais novos conhecem os dois, avião e tartaruga, fica fácil demonstrar e explicar-lhes as diferenças.
Os jovens estudantes de comunicação questionam, cobram posturas éticas na profissão e teve um deles, num dia desses, que me disse: "a razão tem que ser precedida da ética". Eles se interessam muito, assimilam e interagem sempre com boas colaborações além de perguntas inteligentes e pertinentes.
É claro que perguntas tolas, chatas e quase infantis sempre aparecem, mas felizmente são poucas e até normais na sua idade, mas todas acabam sendo esclarecidas com mais ternura do que dureza, para que não se repitam amanhã.
Tem também um assunto que está muito em moda atualmente, que é a preocupação com o meio ambiente - a sustentabilidade socioambiental e não é para menos. Sem querer ser alarmista, percebe-se que a cada dia piora a qualidade de vida, não só nas grandes cidades, mas também no interior, em razão do efeito estufa, do desmatamento desbragado, das queimadas sem planejamento, da ocupação desenfreada dos mananciais e principalmente da falta de consciência do ser humano, que na sua maioria não tem um mínimo de respeito pelo meio ambiente onde vivemos e a consequência disso é que dentro de pouco tempo não mais teremos ar para respirar e água para as mais comezinhas necessidades, enfim, corremos o sério risco de não ter mais nada daquilo que precisamos para sobreviver num mundo pouco habitável, principalmente para as futuras gerações da qual eles, os nossos jovens, têm consciência de que são parte integrante.
Este tema tem sido bastante trabalhado nessas nossas conversas nas faculdades, com um enfoque especifico: “vocês que serão os profissionais de propaganda de amanhã, vocês que vão criar e trabalhar a informação, e as ideias, têm que assumir, desde já um sério compromisso com a sobrevivência do planeta e do ser humano...” Normalmente encerramos esses encontros deixando com os jovens esta proposta para reflexão: “Plante uma árvore ainda que você não vá andar na sua sombra”. Eles entendem e se preocupam tanto com o tema, que em algumas dessas reuniões, continuamos a discutir o assunto por horas, até a exaustão. O interesse de nossos jovens é tão grande que me leva a acreditar sinceramente, que no futuro teremos não só bons profissionais na propaganda, mas principalmente seres humanos de qualidade.

E o que a propaganda tem com isso? Temos tanto a ver com isso que faço um apelo a você que está lendo este meu humilde textinho: nunca deixe de emprestar um pouco de seu know how para os nossos futuros profissionais, nas faculdades, nos estágios e onde mais for necessário, através daquelas palestras que eles sempre nos solicitam, mas que “nunca temos tempo para atender”.
Afinal são eles que vão tocar o negócio da propaganda e a vida no futuro.
Muito obrigado!

(Publicado originalmente em 15 nov 2010, no Propaganda & Marketing)

domingo, 23 de janeiro de 2011

Falta de respeito


Acho que está faltando um pouco mais de noção do que seja o limite de cada um para alguns profissionais de criação e de atendimento de certas agências, e também para alguns daqueles que, atuando no marketing ou na propaganda do anunciante, aprovam o trabalho em nome deste.

Limites do que se pode e não se pode fazer, ou noções simples de que não se pode faltar com o devido respeito ao ser humano, e a qualquer outro ser.

A falta de respeito atual com a mulher chega a ser acachapante. Algum irresponsável dá asas à sua imaginação e, fazendo aquilo que ele entende como sendo "sacadas geniais", comete verdadeiras atrocidades contra a mulher e, como se detestasse a flor, desvalorizando-a, coloca-a na condição de um objeto de uso qualquer.

Grave também é que alguém no cliente aprove essas excrescências e, quando vamos ver, já estão no ar, em plena veiculação. Tem uma peça em que uma tal Musa do Verão, de biquíni, é entregue em domicílio para homens. Um outro anúncio diz que a cerveja tal é tão gostosa quanto mulher, pura ou turbinada.

A falta de respeito, nesses dois casos, não foi só com a mulher, que continua sendo vilipendiada, foi também com o anunciante, que paga por essas besteiras, com o consumidor, que é visto como um idiota, para se deixar envolver por argumentos tão mesquinhos, rastaqueras mesmo e, com a própria atividade da propaganda que, mais uma vez, é qualificada como carente de seriedade.


Nota publicada por Mônica Bergamo na Folha de S.Paulo, dia 12/03/2008.

Agora, por exemplo, a Ambev está prometendo financiar uma campanha de prevenção à dengue em parceria com o Ministério da Saúde e outros setores da área. É para compensar essas grandes besteiras e, a meu ver, não é suficiente para compensar os prejuízos.

Acredito que até o mais novo office-boy de uma agência de propaganda possa antever que tanta "sacada genial" vai dar um rolo daqueles, com as senhoras de Santana chiando, com o Conar mandando tirar do ar, com a mídia baixando o pau na propaganda e tudo aquilo que, sabemos, vira-se contra a nossa atividade. Enquanto isso, meus amigos, a imagem da propaganda vai para o ralo.

Será que não vale a pena consultar o boy da agência antes de finalizar certos jobs tão criativos?

(Publicado originalmente em 16 mar 2008 em www.jornalirismo.com.br)

sábado, 22 de janeiro de 2011

História de um slogan

Conta uma dessas historinhas da boca do povo, que um sujeito dono de uma mordacidade sem tamanho, publicitário e gozador implacável, no afã de "sacanear" essa "pastorzada" pouco séria (tem exceções é claro) que anda por aí pregando aos quatro ventos, nas casas de detenção, nos hospitais, no metrô, na porta dos bordéis, na rodoviária, nas praças públicas, conquistando adeptos na plebe ignara e com isso comprando emissoras de rádio, TV, jornais, gráficas etc. e elegendo deputados e senadores, sempre que passava pela Praça da Sé, parava para observar a pregação daqueles pastores, mas não encontrava um jeito de levar adiante aquela sua intenção de fazer uma gozação.

Um dia atravessando a velha e boa praça, um pastor clamava aos céus por mais ovelhas para o seu rebanho, lendo trechos de Isaias, Jacó, Elias, Corinthios (que horror esse nome, até parece um time de futebol que tem na cidade de São Paulo), Mateus, Lucas, Thiago e tantos outros... Aquela exibição misturada de velho e novo testamento já estava incomodando a própria irmandadade que ia saindo sutilmente à francesa. Só não caíam fora aqueles oito ou dez, que estavam muito próximos das vistas do pregador.

Até que em determinado momento o pastor resolve recorrer aos salmos de David. Os salmos, para quem não sabe, são infalíveis no trabalho de proselitismo. Tem um deles "O senhor é meu pastor, nada me faltará", que é exibido gloriosamente, em azulejos nas casas, em banheiros públicos, nos vidros de carros e até ao lado do pinguim da geladeira.

Naquele calor causticante da Praça da Sé, o pastor se esgoelava cada vez mais e os proselitos diminuindo, dimuinuindo, até que uma voz , lá atrás, gritou uma sugestão:
"leia o salmo 51", completando com a frase: "pode ser uma boa ideia"

O fato é que isso foi o suficiente para provocar uma debandada geral naquela confraria, com todo mundo se lembrando de uma certa marca de cachaça e correndo pro boteco mais próximo pra pedir uma caipirinha com muito gelo, limão e a conhecida 51.

Até hoje ninguém sabe de quem era aquela voz que sugeriu a escolha do salmo 51...

Ninguém sabe?