sexta-feira, 20 de maio de 2011

Publicidade: agência ou corretor?

Todas as boas coisas da vida têm princípio, meio e fim. Geralmente o princípio é muito difícil: tem todo um custo do pioneirismo, além de um estafante trabalho de desbravamento e implantação do projeto. O meio é menos trabalhoso, porque o mais duro já foi realizado na etapa anterior, e o fim é o projeto finalizado e gerando os resultados esperados, além do muito que ele ainda vai produzir, em termos de progresso e bons resultados.

Com os negócios não é diferente. Escolhemos por exemplo, a mídia e publicidade para fazer este comentário.

Mídia - Os jornais, no princípio, não passavam de um simples volante, impresso de um só lado e composto à moda de Gutemberg: os tipos eram colocados organizadamente num instrumento chamado componedor, onde um pioneiro, o tipógrafo (no mundo existiam poucos profissionais nessa área), num trabalho criterioso e demoradíssimo, compunha as palavras e as frases. E à medida que uma linha ficava pronta era passada para a rama, um tipo de caixilho de ferro; posteriormente, todos aqueles tipos eram amarrados, prensados e bem calçados para não caírem, quando se levantasse a rama; em seguida, aquela obra de arte com cara de geringonça, recebia uma camada de tinta através de um rolo emborrachado. Estava pronto o jornal, só faltava imprimir no velho e bom prelo, também do tempo de Gutemberg.
O jornal, ou essa simples folha de papel, era avidamente disputada pelos leitores em todos os pontos da cidade. Era o milagre da informação atingindo a todos, na mesma hora.
Um ótimo começo. As tiragens, geralmente pequenas em razão das dificuldades técnicas, se esgotavam rapidamente. O interesse pela publicação aumentava e, consequentemente, a quantidade de exemplares crescia - e como crescia -, para atender esse interesse de um público cada vez maior. E tome mais papel, mais tinta, mais mão de obra de tipógrafos, mais tempo de prelo e mais gente para distribuir. Aumentavam, dessa forma, os gastos de cada edição e a venda avulsa, por maior que fosse, não era suficiente para cobrir os novos e altos custos com a produção do novo e revolucionário meio de comunicação, tão fundamental para a formação e informação daqueles que sabiam ler e que já eram muitos.

Publicidade - Os donos de jornais e os comerciantes resolveram os problemas de custos, ao perceberem que o novo meio de comunicação era uma grande oportunidade e ferramenta de trabalho, para ampliar o conhecimento sobre as lojas, as marcas e vender mais produtos e serviços, através da publicação de avisos comerciais, os chamados reclames e, é claro, aumentar o tilintar de suas máquinas registradoras.
Nascia, assim, a publicidade, mais ou menos organizada e a partir daí, começava-se a substituir o empirismo daquele propagandista que andava de cima pra baixo, pelas ruas da cidade apregoando aos circunstantes, que a loja do sr.fulano de tal, tinha esse e aquele produto para venda, pela melhor oferta.

Os reclames em número cada vez mais crescente, mas de uma forma desorganizada, suscitaram o surgimento dos corretores de jornal e, com o trabalho desses quase publicitários, os jornais cresciam, aumentando o número de páginas ao mesmo tempo em que a revolução industrial gerava novos equipamentos para todas as atividades e, é claro, também para a indústria gráfica. O varejo, cada vez mais dinâmico, exigia dos corretores mais competência, talento, bom gosto, educação e muitas outras qualidades para se produzir bons reclames e também ousadia para colocá-los em mais de um jornal da cidade e - por que não - também das cidades mais próximas. Prestava o melhor serviço e faturava mais e melhor aquele corretor que trabalhasse com a maior lista de jornais e, como não podia deixar de ser, a concorrência entre eles era uma guerra sem quartel, até que em 1841 um desses abnegados profissionais de comunicação, Volney B. Palmer, se estabeleceu na cidade de Filadelfia - USA, para fazer o trabalho de angariar os avisos e encaminhar aos jornais os textos que estes transformavam em reclames, e os publicavam nas próximas edições. É muito justo que se diga que o trabalho de Palmer já era praticamente o embrião de uma agência de publicidade, pois que ele vendia os espaços, organizava os reclames nas frequências combinadas, selecionava os jornais, já de acordo com o público leitor, determinava os tamanhos e os preços conforme as tabelas de cada jornal. O jornal, por sua vez, cobrava dos anunciantes e repassava a comissão para os corretores. Essa foi a primeira forma de relacionamento entre o veículo e o corretor. Funcionava bem, atendendo aos interesses de ambos, pois ninguém perdia, só que os reclames não tinham a qualidade que os anunciantes necessitavam.

Foi assim que já semi-organizada, a publicidade chegou ao Brasil. Mas ainda, por muito tempo, prevaleceu entre nós uma espécie de império dos corretores, e a guerra entre eles não acabou, pelo contrário, recrudesceu, pois aqui no Brasil tinha o clima ideal para a instalação de todas as desavenças, possíveis e imagináveis. O crescimento do nosso parque industrial, com a vinda de grandes empresas estrangeiras e a formação de um comércio promissor, não aceitava mais trabalhar com o amadorismo individual dos corretores que tiveram de se organizar numa estrutura capaz de prestar um trabalho compatível com o desenvolvimento do país, dos negócios e dos próprios consumidores. Estava dada a partida para a atividade de agência de publicidade no Brasil.
E então, já no século passado, ali pelos anos 1920/30, o Brasil já começava a ter boa estrutura de agências de publicidade, produzindo um trabalho com a qualidade que os meios de comunicação e o mercado anunciante tanto precisavam. Isso foi de fundamental importância para desafogar os anunciantes, os jornais e outros meios, que se independeram da limitação dos chamados contatos diretos e corretores individuais. Mais do que isso, com as agências, a publicidade se revelou um negócio dos mais prósperos não só para elas, mas também - e principalmente - para os anunciantes e veículos, que passaram a contar com uma parceria organizada não só profissionalmente, mas em todos os outros aspectos. Isso colaborou enormemente para a criação de uma grande indústria de fornecedores de insumos básicos, como serviços gráficos, pesquisas e estudos mercadológicos e, principalmente, para a formação de uma grande e invejável malha de meios de comunicação, como a que temos hoje no Brasil, igual e até melhor que noutros países mais adiantados.

O grande deslanche da publicidade, dos veículos e dos anunciantes em nosso país, começou no fim dos anos 1930/40 e um fator que muito ajudou a alavancar esse deslanche foi o tipo de remuneração da agência de publicidade. O veículo pagava um honorário de 20% pelo seu trabalho de desenvolver o mercado anunciante, criar todas as peças para veiculação, cobrar os valores de inserções e acompanhar passo a passo cada anúncio até a entrada deste no veículo. A agência, responsável pelo recebimento dos valores, cobrava 100% do anunciante, pagava 80% para o veículo, devolvia os 20% para o mesmo anunciante, cobrando deste um percentual de 17,65% sobre os valores líquidos veiculados. Cobravam também, é claro, um honorário de 15% sobre valores de produção em cima das notas fiscais de fotolitos, clichês, estéreos, impressos e outros materiais. Posteriormente, passamos a reter integralmente os 20% sem cobrar os 17,65% do anunciante. Tudo isso funcionava de acordo com a Lei 4.680, até quando resolveram desregulamentar a profissão, criando novas normas, novas tabelas de cobrança e, a partir daí, o negócio da publicidade se transformou num verdadeiro mercado persa, onde, com raríssimas exceções, vence aquele que conceder mais descontos, vantagens e benefícios, enfim aquele que tiver mais capacidade e vocação para a prática da autofagia.

Hoje, em pleno iniício do século 21, os veículos parecem ter perdido a confiança que sempre pautou suas relações com as agências e, ao que tudo indica, as regras de remuneração vão mudar: o veículo pretende cobrar diretamente do cliente o equivalente a 80% do valor veiculado e a agência que se vire para receber os seus 20%. O que significa que o honorário de agência vai deixar de ser pago pelo veículo conforme estabelece a Lei 4.680. Ora, conhecendo como conhecemos certos anunciantes, já podemos antecipar que vão querer negociar os honorários; outros, quando pagarem, vão querer calcular os seus 20% em cima do valor líquido cobrado anteriormente, ou seja: um anúncio cujo custo bruto de tabela é 10,0, o cliente pagando 8,0 diretamente para o veiculo, não há de querer pagar o honorário de 20% de agência sobre os 10,0 iniciais, mas sobre os 8,0 líquidos, o que não é 2,0 mas 1,6. Uma outra alternativa que está sendo aventada como salvação da lavoura é o veiculo cobrar o valor total da veiculação e, após receber do cliente, devolver os 20% de honorários da agência já deduzindo os impostos. Felizmente esse racicínio sobre os anunciantes não é a regra, mas que tem muitas exceções, isso tem.

Qualquer uma das duas formas acima não atende aos interesses pecuniários, e principalmente aos valores morais e profissionais da agência de publicidade.

Para um velho publicitário como eu, que atua neste mercado ha mais de 50 anos, escrever sobre isso, nesses termos, é muito triste, chega a ser um retrocesso, porque parece que estamos voltando no tempo e, francamente, não sei onde vamos parar, o que sei é que, se não tomarmos muito cuidado, vamos voltar, sim, ao tempo dos corretores e do amadorismo. Isso é tudo o que não queremos para a nossa atividade, que lutou tanto contra tudo e contra todos para criar uma personalidade própria e sempre fez por merecer o respeito, não só da nossa comunidade mas de todos os segmentos da sociedade brasileira.

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